Entre
os dias 16 e 19 de maio, tive a felicidade de participar da 10ª Galhofada
Cultural, aqui em Goiânia. Um evento que por algumas de suas particularidades
já seria bastante sui generis, afinal,
uma mostra de teatro feita no meio da
rua e da comunidade já é por si só algo inusitado, mas que por conta de outros fatores
torna-se ainda mais envolvente e impactante.
Destaque-se
que é praticamente uma operação de guerra, com um batalhão de pessoas
envolvidas com o intuito único de levar, como diria a música, “diversão e arte”
de forma gratuita e sincera para a população. É bom lembrar que os artistas
participantes doaram seu tempo e esforço para que o evento acontecesse. Sem
cachê, sem patrocínio, sem jabaculê. E sem qualquer apoio governamental ou de
alguma lei de incentivo, ato raro em um país rico em cultura, mas pobre em
investimentos na área (pelo menos aqueles onde não se vê uma lei de incentivo
por perto).
Entre
os que carregam a bandeira do evento, estão a Oficina Cultural Gepetto, o
Teatro Zabriske, Grupo de teatro NuEscuro, Cia de Teatro Poesia que Gira,
Teatro que Roda, além de vários outros grupos
e abnegados como Marcos Lotufo, que insistem em levar adiante tal
empreendimento em nome de algo que está cada
dia mais raro de se encontrar por aí. Estes malucos do bem fazem o que fazem em
nome do amor.
Amor...
Pela Arte.
Foi
lindo ver palhaços, mágicos, atores e atrizes, equilibristas, músicos, artistas
das mais variadas gamas dando o melhor de si em atuações de delicado fervor, acompanhados
de perto por um público que era composto desde a população das redondezas,
gente que comumente não tem acesso a nenhuma forma de arte ou evento cultural,
até grandes apreciadores das artes, que ali estiveram para conferir o que
acontecia no evento. Bonito de ver também foi o apreço que as pessoas deram à
nossa banquinha de troca de livros; crianças, adultos, idosos ou adolescentes,
era nítido o olhar reluzente que transmitiam, toda vez que topavam com um
título conhecido ou algum exemplar há muito desejado. O exercício da literatura
também é isso, aproximar o público dos livros.
Amor...
Pelos colegas de profissão.
Uma das coisas
que ficaram impregnadas na memória foi observar de perto a união do pessoal do
teatro / circo. De empréstimo de figurino a ajuda para compor público, ali se viu de
tudo que um artista pode fazer em favor do outro. Uma camaradagem genuína,
daquele tipo que não se vê todos os dias. Arrisco a dizer que, se na literatura
local tivesse semelhante movimento, as coisas seriam bem melhores para nossos
escritos...
Amor... Pelo
próximo.
Além de todo o
contingente de artistas que dedicaram tempo e esforço para tal empreendimento,
houve também todo um aparato de apoio por trás da lona: cenógrafos,
iluminadores, operadores de áudio, até uma cozinha inteira, que alimentou não
só o exército de voluntários, como também uma parte de público, que teve a
oportunidade de saborear deliciosos pratos no meio daqueles que apresentavam-se
por ali. Lembro que, quando desarmava diariamente minha barraquinha de livros,
juntamente com a parceira Izaura Franco, quando tinha que carregar algum dos
mais variados itens que acabamos levando para estes eventos, geralmente
aparecia, assim quase do nada, algum integrante de grupo teatral ou pessoal do
apoio e punha-se a ajudar na hora, espontaneamente, como devem ser feitas todas
as boas ações. Fica a lição de civilidade e companheirismo, mesmo daqueles que
nem cheguei a conhecer devidamente. Registre-se também que, mesmo nos dias de
sua máxima lotação, não vislumbrei um único ato de vandalismo ou confusão no
local; parece que a aula de cidadania dada pelo evento conseguiu ludibriar até
dona violência, que agradecidamente não deu as caras por lá.
Amor... No ar. Entre o público, entre as
crianças, entre os espectadores e as apresentações, entre os músicos, artistas,
nos palcos, nas ruas, no cortejo e na Ilha da Galhofa, na Feirinha de Pulgas,
debaixo da lona ou no meio do picadeiro, o que se via ali era um exercício de
amor. Pela arte, pelo companheiro, pelo próximo.
O
amor, sempre ele. Até quando apresentou-se em sua singela forma fraternal. Veio
por conta do bate-papo descontraído com um dos leitores presentes no estande, Júlio
Cesar, que teve a felicidade de partilhar da intimidade de uma grande poetisa
como Yeda Schmaltz. Fez ele um emocionado relato daqueles anos que dividiu com
sua amiga de tal modo que pode-se sentir como se ela estivesse ali, conosco naquela
barraca de livros, trocando impressões sobre o movimento de pessoas e artistas
no local, da felicidade que é poder participar de um evento genuinamente
artístico, de amor pela arte e pelo outro... A voz, por vezes embargada, fez um
retrato fiel do relacionamento ─ conturbado em alguns momentos, como deve ser
toda amizade sincera ─ mas, que no fundo deixava entrever o amor que ali
existiu até depois do final.
Exatamente o mesmo tipo de amor que
parecia emanar da Ilha da Galhofa, naqueles quatro dias de efervescência
cultural.
2 comentários:
Legal, cara, não sabia da existência desse evento. Quando acontecer outro, avisa o pessoal aqui de Brasília.
Muito legal esse evento, também não sabia da existência. Deve ser muito fantástico participar!
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